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sábado, 19 de dezembro de 2009

MORATÉIA DESVAIRADA - texto abre alas

Francisco Morato. Cidade dormitório. Terra falada nos telejornais nacionais por seus altos índices de pobreza, por suas chacinas e inúmeras formas de violência. Situação diferente de tantas outras cidades do Brasil?

É inegável que nesta cidade, há sim fome, miséria e violência. Porém, falar só isto, é mostrar apenas um lado da moeda e talvez seja preciso uma atitude desvairada que ajude a virar esta moeda e mostrar que do outro lado há pessoas cidadãs que se inquietam (procuram perseguir e cutucar as raízes do porque este dormitório permanece há tanto tempo com suas luzes apagadas.
Moratéia Desvairada é um movimento cultural que reúne cidadãos (educadores-cidadãos, artistas-cidadãos, estudantes-cidadãos, cidadãos-cidadãos) que simplesmente não aceitam fazer parte dos currais que imperam já há muito tempo na cidade de Francisco Morato. Currais que alimentam a indústria megalomaníaca da pobreza, que alimentam os coronéis que enriqueceram e continuam enriquecendo nesta cidade, que alimentam uma visão empobrecida da esfera pública e da cidadania. É preciso desvairar num ato de rebeldia para não aceitar-se vaca deste curral e por outro lado, semear sua destruição.

Esta cidade é feita por nordestinos, húngaros, caipiras, ciganos, bolivianos, chineses e sobretudo por uma profunda atmosfera de não-pertencimento. Impressão clara e desoladora de que as pessoas passam pelas ruas e andam por um lugar que não as pertence. Por isto tanto sujeira, por isto tanta violência, por isto tanta doença.

Pois esta é a mesma situação que vemos dentro dos circuitos que se apoderam para administrar a cidade. Se elegem defendendo seus interesses devoradores, saqueiam a pouca riqueza pública e sobretudo lutam com unhas e dentes para manter suas vaquinhas pastando com mansidão.
Nada permanece. Não permanecem atividades fecundas. Não permanece um teatro para a cidade. A briga voraz pelos currais impede que a construção de fato democrática faça nascer projetos, espaços, que não vão embora no transitar de uma equipe administrativa pública para a outra.

Por isto desvairamos. Nos articulamos continuamente através de diálogos e ações que nos façam caminhar com mais força em nossos projetos culturais e acima de tudo, que nos fortaleça neste confronto necessário com a esfera pública, a qual insistimos, tem o dever de promover Políticas Públicas com toda a democracia e respeito.

Vejamos nosso Forte do Forró, evento anual feito para supostamente homenagear a legião nordestina que existe por aqui. Montam barracas de associações comunitárias, chamam os hits do momento para tocar e batem no peito dizendo atender o que o povo gosta. Sim! Mas será nosso povo nordestino tão medíocre a ponto de ser valorizado apenas em evento? E suas memórias? E suas contribuições? A velha e porca política de eventos que impede a construção de uma política com sentidos e valores menos apelativos.

O povo gosta! Será que nossos administradores se perguntam que povo é este? Que gente é esta arrastada da saída dos trens para estas festas apelativas? O que mais foi oferecido a ela para que ela determinasse com autonomia o que de fato gosta ou não? É difícil falar de um oceano pra quem viveu a vida inteira preservando vacas magras e terra infecunda.

É muito fácil sustentar-se em cima de argumentos frágeis como “o povo gosta!”. Difícil é persistir no significado da cultura para um povo e transformar esta persistência em exercício. Fazer isto significa desmamar muitas vaquinhas! Fazer isto significa tirar o encosto de muita gente que aprendeu a se escorar na esfera pública a partir de conveniências que na maioria das vezes não consideram competência, criatividade e desejos diversos de um povo. Não consideram acima de tudo o ser humano e sua capacidade de inventar, construir, interferir num espaço.

Somos a Moratéia Desvairada! Nossa luta é pelo respeito à Cultura desta cidade!

Achegem-se conosco!

Ah! Vale lembrar que não temos padrinhos nem casas apadrinhadas que nos determinam ou orientam. Agimos no acordo dos que se abrem ao diálogo e só! Negamos estar sob a tutela de partido A, senhor B ou instância C. Assim como negamos nos aliar aos meandros que construiu este câncer público. E também por isto já avisamos de antemão que não aceitaremos compor batalhões para guerrinhas de interesses já existentes pelos currais que tanto repudiamos. Guerras que se findam com a disponibilização de tetinhas fartas que fazem calar os gritos.

Acheguem-se! A caminhada é longa e muitas são as cercas que formam este curral.

Desvairemos todos juntos pra arrebentar com a porteira.

Eduardo Bartolomeu
teatrogirandola.blogspot.com

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